Vivências extravagantes

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Vivian Wrona Vainzof

Visitei esses dias e numa passada só, uns três ou quatro teatros de cidades brasileiras, que me deixaram perdidamente alucinada pelas pinturas dos tetos, os camarotes, a palha das cadeiras no estilo original. O Teatro Amazonas com seus lustres e colunas circundando as poltronas, o de Niterói, que abrigou o último show do Tim Maia, de onde ele saiu no meio, direto para o hospital, e de lá não voltou. Conheci o Teatro da Paz, que eu não tinha visitado quando estive em Belém, e me arrependi. Tudo bem cheio de exagero, cheio de rococó, cheio de detalhes, cheio de extravagâncias. Os excessos de antigamente.

Ali na galeria, poucos dias depois da vernissage da Flavia Junqueira, de frente para as plateias vazias das fotografias nas paredes, consegui ouvir as orquestras de outros séculos, as óperas, os espetáculos. Vi entrar toda gente bem vestida, de chapéus, de vestidos volumosos, damas e cavalheiros usando palavras rebuscadas, quando os teatros eram as redes sociais e a cultura era a exigência das classes abastadas.

Quantas saudades desse tempo que eu não vi. Creio que estaria em casa, nessa época em que as conversas eram o centro das relações, sem abreviações nem corretor ortográfico. Eu apreciaria a espera pelo próximo encontro, se isso significava ouvir as histórias com mais emoção e menos emojis. Quando os passeios eram de braço dado, as falas tinham olhos e ouvidos. Quando os encontros vinham com ópera ou chá e tinham demora.

Conversar é complexo. Exige presença, exige reconhecimento e consideração pela outra pessoa. De outra forma, bastam os eletrônicos. Mas “os aparelhos são vazios de experiências”, ouvi a Julieta Jerusalinsky dizer com sotaque do sul, ontem, na Matutaí, convocando os pais ao trabalhoso papel de pais.

As crianças precisam de alguém para enxergá-las e não apenas olhá-las. ”As crianças precisam se ralar”, continuava a Julieta, “e precisam de alguém que traduza a vida para elas, que as apresente à cultura e à linguagem humana”. Para algumas crianças, o outro com quem mais convivem é um aplicativo, mas os eletrônicos não farão isso por elas. De onde só se pode concluir que é preferível esfolarem os joelhos a brincarem, seguras, atrás das telas…

Os excessos do futuro já estão presente. Tudo bem cheio de exageros e sem rococó, bem cheio de vivências extravagantes e compulsões carentes de encontros e vazias de ideias.

Espetáculos demais e salas mais vazias que aquelas retratadas pela Flavia Junqueira.

Pode-se aprender alguma coisa em jogos educativos virtuais, mas não se aprende, ali, a ser gente.